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domingo, 22 de junho de 2008

Sobre o filme CLOSER (Perto demais)

Prá vocês, que têm se interessado pelas minhas reflexões e pelos meus escritos, segue um texto anterior ao filme (à época não tinha assistido ainda). Hoje este filme ocupa um lugar reservado dentre os meus favoritos, após tê-lo visto apenas uma dezena de vezes. O ponto forte é questionar o quanto é preciso e/ou possível suportar ao lidar com a verdade. Ou ainda : é realmente necessário saber a verdade o tempo todo ?

Lembrem-se de que sempre escrevo a partir de um sentimento ou refletindo sobre um texto lido; este é mais um, bem curtinho. E ainda hoje, não mudaria uma vírgula.


Um beijo,
Dayse
31/maio/2008

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Fevereiro/2005

Há algum tempo atrás, assisti no teatro a encenação deste texto. Lembro-me bem, pois saí do teatro com um certo desconforto. À época, creditei às instalações do teatro (Carlos Gomes, na Praça Tiradentes, RJ), achando que teria sido esta a causa do meu desconforto.

Ainda não tive chance de ir ao cinema para assistir a este filme. Afinal, estamos numa temporada especialíssima, em que o tempo me foge às poucas oportunidades que tenho para ir ao cinema (um dos meus programas favoritos) e as opções à minha escolha são inúmeras (umas 8 !).


Mas acho que encontrei, no jornal O Globo de hoje, uma resposta para aquele meu desconforto do passado. Ainda me dói “trocar o romantismo do passado pelo ceticismo das relações amorosas” atuais. Não sou tão prática e “moderna” assim. Ainda me “parece tentadora a idéia de contrariar o verso de Duclós e encontrar alguém que acalme nossa histeria e nos faça interromper as buscas.” Taí o texto abaixo, de uma escritora que aprecio muito, e que traduziu melhor boa parte do que acredito ser o “desencontro” de expectativas nas relações atuais.


Bom domingo !
Dayse
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Publicado em 20 de fevereiro de 2005 na revista do Jornal O GLOBO (RJ)

Martha Medeiros - Interrompendo as buscas

ASSISTINDO AO ÓTIMO “CLOSER — Perto demais”, me veio à lembrança um poema chamado “Salvação”, de Nei Duclós, que tem um verso bonito que diz: “Nenhuma pessoa é lugar de repouso”. Volta e meia este verso me persegue, e ele caiu como uma luva para a história que eu acompanhava dentro do cinema, em que quatro pessoas relacionam-se entre si e nunca se dão por satisfeitas, seguindo sempre em busca de algo que não sabem exatamente o que é. Não há interação com outros personagens ou com as questões banais da vida. É uma egotrip que não permite avanço, que não encontra uma saída — o que é irônico, pois o maior medo dos quatro é justamente a paralisia, precisam estar sempre em movimento. Eles certamente assinariam embaixo: nenhuma pessoa é lugar de repouso.

Apesar dos diálogos divertidos, é um filme triste. Seco. Uma mirada microscópica sobre o que o terceiro milênio tem a nos oferecer: um amplo leque de opções sexuais e descompromisso total com a eternidade — nada foi feito pra durar. Quem não estiver feliz, é só fazer a mala e bater a porta. Relações mais honestas, mais práticas e mais excitantes. Deveria parecer o paraíso, mas o fato é que saímos do cinema com um gosto amargo na boca.

Com o tempo, nos tornamos pessoas maduras, aprendemos a lidar com as nossas perdas e já não temos tantas ilusões. Sabemos que não iremos encontrar uma pessoa que, sozinha, conseguirá corresponder 100% a todas as nossas expectativas — sexuais, afetivas e intelectuais. Os que não se conformam com isso adotam o rodízio e aproveitam a vida. Que bom, que maravilha, então deveriam sofrer menos, não? O problema é que ninguém é tão maduro a ponto de abrir mão do que lhe restou de inocência. Ainda dói trocar o romantismo pelo ceticismo, ainda guardamos resquícios dos contos de fada. Mesmo a vida lá fora flertando descaradamente conosco, nos seduzindo com propostas tipo “leve dois, pague um”, também nos parece tentadora a idéia de contrariar o verso de Duclós e encontrar alguém que acalme nossa histeria e nos faça interromper as buscas.

Não há nada de errado em curtir a mansidão de um relacionamento que já não é apaixonante, mas que oferece em troca a benção da intimidade e do silêncio compartilhado, sem ninguém mais precisar se preocupar em mentir ou dizer a verdade. Quando se está há muitos anos com a mesma pessoa, há grande chance de ela conhecer bem você, já não é preciso ficar explicando a todo instante suas contradições, seus motivos, seus desejos. Economiza-se muito em palavras, os gestos falam por si. Quer coisa melhor do que poder ficar quieto ao lado de alguém, sem que nenhum dos dois se atrapalhe com isso?

Longas relações conseguem atravessar a fronteira do estranhamento, um vira pátria do outro. Amizade com sexo também é um jeito legítimo de se relacionar, mesmo não sendo bem encarado pelos caçadores de emoções. Não é pela ansiedade que se mede a grandeza de um sentimento. Sentar, ambos, de frente pra lua, havendo lua, ou de frente pra chuva, havendo chuva, e juntos fazerem um brinde com as taças, contenham elas vinho ou café, a isso chama-se trégua. Uma relação calma entre duas pessoas que, sem se preocuparem em ser modernos ou eternos, fizeram um do outro seu lugar de repouso. Preguiça de voltar à ativa? Muitas vezes, é. Mas também, vá saber, pode ser amor.

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